O que eu ouvi de legal em abril de 2023

Gustavo Sumares
5 min readMay 12, 2023

Embora eu não escreva mais o 10 do Mês, eu ainda (pasmem) ouço música. E boa parte dessa música, percebi recentemente, ainda é nova. Pois é: depois de quatro anos de hábito, entrar nos arquivos do NewAlbumReleases e jogar palavras bizarras no buscador do Spotify continua na minha memória muscular. E ao que parece, escrever sobre o que eu ouço também.

Não vou fazer playlist nem me comprometer com um número fixo de artistas, ne em fazer isso todo mês. Mas gostaria de falar periodicamente sobre algumas das coisas legais que eu ouvi graças a essa memória muscular. O hábito de buscar artistes diverses (em termos de gênero musical, identidade de gênero, etnia, sexualidade, geografia, etc.) também continua. Mas como qualquer cidadão do Ocidente, estou sujeito à m̵á̵q̵u̵i̵n̵a̵ ̵d̵e̵ ̵p̵r̵o̵p̵a̵g̵a̵n̵d̵a̵ indústria cultural norte-americana, e alguns frutos dela me parecem dignos de nota.

Também sigo tentando privilegiar artistas menos ouvidos, mas não vou focar tanto nisso. Pra não dar spoiler, a capa vai ser uma foto que eu tirei no período em que ouvi as faixas abaixo. E vou listar as bandas em ordem alfabética, a única que faz sentido pra ordenar música (além da cronológica, que não adianta muito aqui).

Bora:

ATARASHII GAKKO! — ICHIJIKIKOKU

Elas meio que venceram por pontos. Eu não consigo abrir o TikTok sem ouvir “OTONABLUE”, faixa que você também talvez conheça e não saiba o nome. Depois da milésima vez, eu resolvi ouvir o disco de estreia desse quarteto de moças japonesas (cujo nome [acho] quer dizer “nova escola”) que existe desde 2015 mas só lançou um trabalho maior agora. ICHIJIKIKOKU (“Retorno temporário”) é um baita disco de pop. A produção é afiadíssima, as moças cantam bem, as composições são afiadíssimas e “OTONABLUE” realmente é uma puta música, embora “Giri Giri” e “JANANDAYO” não fiquem atrás. Algumas faixas tem uma pegada mais funkeada, outras tem aquele ânimo “abertura de anime” comum ao J-Pop, mas todas são boas. 23 minutos que valem muito a pena.

Rodrigo y Gabriela — In Between Thoughts…A New World

Eu adoro essa dupla. Fui no show deles lá em 2016, tirei foto com eles, etc. O que eles fizeram só com dois violões em 11:11 (de 2009) e 9 Dead Alive (2014) muitas bandas não fazem a carreira toda. De lá pra cá, eles deram uma ampliada no rock/metal acústico e incluíram outros instrumentos, e esse disco novo é a culminação desse caminho novo. Ainda tem bastante fritação (como o solo daora de “Broken Rage”), mas faixas como “The Eye That Catches the Dream” e “Descending to Nowhere” tem um aspecto mais cinematográfico, meio de trilha sonora — graças em grande parte às cordas que entram em vários momentos. Isso tudo sem perder as batidas latinas e o foco nos violões que caracterizam a banda. Muito foda.

Melati ESP — hipernatural

Esse é o nome artístico da compositora indonésia Melati Malay. É um disco de música eletrônica dançante, mas meio etérea. A produção usa a voz de Melati, outros samples de voz, batidas de jungle (mas frequentemente mais lentas), alguns beats com som de 808 e sintetizadores distantes, viajados. Não dá pra entender direito, mas acho que ela canta em indonésio (as faixas, pelo menos, têm nomes nesse idioma), o que (para mim pelo menos) torna o som ainda mais exótico. É um som que pode ser empolgante ou relaxante dependendo do seu humor. “E.M.Z.” e “INTUISI” acabaram sendo as minhas favoritas. Me lembrou o disco da NTsKi, do 10 do Mês de Agosto de 2021 — que acabou sendo um dos meus discos favoritos daquele ano.

motifs — remember a stranger

Botei esse disco pra tocar sem muitas expectativas, mas logo a segunda faixa, “fluorescent”, me fisgou profundamente. O quinteto de Singapura se descreve como tocando shoegaze/dreampop, e a descrição me parece precisa. Se você tirar uma média entre My Bloody Valentine e Cranberries, daria mais ou menos neles. É um som denso, com andamentos medianos, guitarras e vocais reverberantes, clima melancólico (me pareceu a cara do outono) e alguns momentos mais ruidosos. Esse é um daqueles casos em que o capa reflete bem a música que ela acompanha. Sons nesse estilo geralmente focam mais no clima, mas faixas como “hourglass” também tem linhas melódicas memoráveis, o que me surpreendeu bastante. E esse álbum foda é só o primeiro trabalho do grupo.

Suté Iwar — ULTRALIGHT

É só ouvir uns segundinhos desse disco que você sabe que o produtor nigeriano Suté Iwar não brinca em serviço. Seu segundo álbum é (segundo a Pulse) estruturado como se fosse a trilha sonora de um documentário sobre a vida dele, e de fato parece algo ao qual ele dedicou muito tempo. É um trabalho de beats, rimas e melodias, todos em excelente qualidade. Tem uns kicks que você sente no fundo do peito, samples muito bem usados, raps foda (destaque pro rapper Ogranya em “EARTH ANGEL”) e melodias grudentas (vide “MEDITATE” e “JUDAH LION”). Eu não saberia definir o estilo — li termos como “afro-fusion” e “RnB alternativo”, mas se você já ouviu qualquer música pop eletrônica focada em batidas, você já ouviu algo parecido — talvez não tão legal.

Where the Waves Are Born — Sundered

Sexteto de metal de Astúrias, na Espanha, que faz um som pesado mas melodioso, emocionalmente intenso, misturando guitarras distorcidas com momentos silenciosos, vocais cantados e gritados, e batidas pesadas mas em andamentos geralmente mais lentos. Eles se descrevem como “hardcore melódico” ou “pós-hadcore”, mas o som me lembrou bastante bandas de metal viajadas como o Lantlôs. Sundered é o primeiro EP deles, com 23 minutos em seis faixas, e é um trabalho redondinho. Eu comecei achando meio genérico, mas a segunda metade, com “Scandinavian” e “Distant”, me chamou bastante a atenção.

E por enquanto é só. Quem sabe no mês que vem a gente não se encontra por aqui de novo? Fique bem até lá!

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Gustavo Sumares

Jornalista, roteirista, editor, revisor. Falo aqui sobre música, especialmente por meio do 10 do Mês!